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sábado, 27 de maio de 2023

A morte perfeita.

Tarde de Outono…


Relógio de sala da época vitoriana com forte "tic-tac"...


Chaleira ainda em assobio mas já esquecida…


Cadeira de baloiço…


Manta/xaile sobre as pernas…


Gatinho no parapeito da janela tentando observar para lá do vidro embaciado…


Braseiro meio aceso, meio apagado…


Há um quadro/retrato de uma bela jovem que parece que nos observa… 


Mão gélida, fraca e frágil…


Óculos redondos no fundo do nariz.


Livro descaído sobre o colo revelando no meio das páginas uma carta de poemas recebida à 40/50 anos de alguém que nos fez viver mas que nos deixou e nos matou…


Reapareceu…

E nos ressuscitou…

Nos amou…

Nos entronizou como rei dos príncipes…

Mas sem adeus, partiu…


Passaram anos… muitos anos…


Numa alucinação em delírio final,

A última aparição…

Sonho ou pesadelo?...

Parece real…


Era uma manhã de Primavera num mercado de flores em Paris, uma cara na multidão nos olha…


Era uma velha!...


Aproximou-se e disse:

"Não me perdoes, não quero, não o mereço.

Portugal é lindo mas o mundo fervilhava por mim…

Embora fosses o meu mundo, 

Não eras o mundo…

E eu vi o mundo!…

Encontrei tudo o que desejei…

Mas nada do que desejei me preencheu…

Pois tive tudo o queria mas não te tive a ti…

Bebi bom champanhe, mas com o amargo de beber sem ti…

Tive lindos vestidos mas sem me dizeres que eu estava linda…

Palhaço, porque tanto me marcaste não me permitindo felicidade mais além?…

Odeio-te porque me amaste como jamais alguém me amou…

Morre velho desgraçado!...

Que se parta essa tua cadeira de baloiço nesse teu chalé metido a britânico…

Não sem antes saberes que morri no dia em que parti!...

Não que tenha morrido, mas morta por viver sem ti!...

Nunca te esqueci, nunca te esquecerei…

Descansa em paz, eternamente, amar-te-ei!..."


"Senhor, então?

Não deu conta da chaleira? 

Olha, adormeceu…

Mas está a sorrir?...

Com certeza estaria a ler alguma doidice…

Até deixou cair este papel…

Senhor que se passa, sente-se bem?…


MEU DEUS!!!…"